Prepare-se para uma postagem "grande"...
Quem não gosta de ler, sugiro ir logo para o próximo site...!
;o)Ontem fiz três coisas que me deixaram mais feliz.
COISA UM:Uma foi "cortar o cabelo"...! Eu não sei como é com as outras pessoas, mas eu, chega um momento que o cabelo parece que começa a "atrapalhar"... Fica sem jeito, cresce demais, irrita. E o mais gozado é que ele parece que "muda" de um dia para o outro... De uma semana para a outra... De repente ele está num "tamanho ideal" e no outro dia ou dois dias depois
BOING!, ele parece que "pira" e não funciona mais...!
Aí eu vou "resistindo" até não poder mais, até não aguentar mais, até ele crescer a quase o limite do grotesco (que é variável de pessoa a pessoa...) e então, corro para o meu velho barbeiro de sempre, de muitos e muitos anos e ele me pergunta sorridente, com aquela cara de felicidade em destruir mais uma "floresta de cabelos":
"Vamo derrubá??" e eu aceno com um feliz
"VAMO" enquanto folheio uma das sempre existentes revistas de mulheres nuas que se acumulam aos borbotões por lá...
Então, como um Sansão invertido, saio de lá mais leve, feliz, com
OUTRA CARA...! E a vida parece recomeçar, agora com uma cara mais "limpa", um ar mais elegante, um jeito de
"oh, baby, I'm so sexy"...!! Hehe!! :oD
Tá, nem tanto, mas melhora o meu astral...!
Taí. Tu vê... Cabelo. Coisa estranha, não?!?!
COISA DOIS:Eu estava chegando em casa da barbearia, estaciono o carro, desço, ligo o alarme e escuto aquela voz sôfrega ao meu lado perto de mim, enquanto me dirijo rapidamente ao portão do prédio, carregando um par de grandes lâmpadas fluorescentes para a cozinha (que estava às escuras...):
"Moço", ou
"Tio", não lembro...
"O senhor pode me ajudar?"Era um sujeito até jovem, mas certamente castigado já pelas agruras da rua... Obviamente estava sujo e mais escuro ainda pela tênue luz da frente do prédio. Já era "de noitezinha"... Era um rapaz ainda jovem, por certo. Não sei precisar a idade, mas entre 18 e 20 e poucos. Branco. De boné... Usava um monte de camisas e roupas sobrepostas. e por cima uma jaqueta velha de algum tipo. Não lembro bem.
Minha primeira resposta foi a que todos ensinam por aqui a fazer com quem pede nas sinaleiras, nas ruas:
dizer não. Aquela velha desculpa esfarrapada,
"Não tenho nada agora...", "Tô sem trocado...", "Desta vez não tenho; na próxima eu te ajudo...", onde a gente
a) quase sempre tem, sim, alguma coisa, b) geralmente se tem, sim, trocados, e
c) normalmente se sabe que dificilmente vamos voltar a encontrar a criatura pedinte...
E ele continuou:
"O senhor não me consegue aí alguma roupa, algum sapato velho pra mim...?"Quando me pediu as roupas ou os sapatos, acho que deu um
CLICK! diferente no meu cérebro...
Enfim, o cara NÃO estava me pedindo dinheiro e nem mesmo comida (que é algo bem comum de fazerem e até normal de pessoas de rua pedirem...). Com aquele frio que estava, ele me pediu roupas ou um "calçado velho"... Foi quando olhei pra baixo e vi que o sujeito estava de bermudas - com aquele frio! - e além das pernas de fora, ainda estava de pés no chão...!
Putz...
:o|Olha que eu costumo ser reticente com os pedintes em geral (confesso, para meu martírio e execração pública...), até porque a miséria não se acaba com esmolas, mas com elas talvez se alimente a "indústria" dos pedintes... MAS... Ao olhar o sujeito, de pés no chão, com aquele frio...
Ele não me pediu dinheiro - fato que pesou a favor dele...! E foi bem "educado"... Me chamou de "senhor", não foi "prepotente" pelo fato de estar "na rua"... Tem gente que usa o fato da sua pobreza ou miséria pra atentar, pra afrontar ou pra causar medo...
Ele não. Foi singelo. Educado. Quase envergonhado.
E enquanto eu ia abrindo o portão de ferro eu pensei e disse:
"Ok, eu vou ver se tenho um sapato lá em cima, pra te ajudar. Acho que tenho. Isso eu posso te conseguir. Segura aí um pouquinho que eu já vejo e te jogo da sacada"... Acho que negar uma ajuda a alguém que pede é mais comum do que a gente mesmo se dá conta. Já nos habituamos com isso, com pedintes. E com a própria vida, nossa, restrita, dentro dos nossos alcances e luxinhos. Mas ali, na minha frente, estava alguém que não tinha luxo algum. Estava desprovido de tudo, ate´de orgulho, talvez, mas não de humildade.
E o rapaz ficou falando que o calçado dele tinha sido roubado enquanto dormia... E que tinham tentado roubar também a caixa de engraxate que ele levava no ombro... Que ele teria tomado uma facada na mão, mas que não teria deixado levar sua caixa...
Eu olhei rapidamente pra mão erguida dele enquanto entrava... Não vi nada senão uma pequena cicatriz (ou seria uma sujeira) no centro da palma da mão... O portão se fechou enquanto eu dizia para ele se manter ali que eu veria o que poderia fazer...
Fechei a segunda porta, a de madeira, do prédio, pensando se ele se manteria ali ou se imaginaria que o que eu disse seria mais uma "lorota" das tantas que ele de certo ouve, promessas de roupas, calçados, trocados, comidas, sei lá, de pessoas que apenas querem "se livrar do problema"... e aí dizem qualquer coisa pra fugir logo do "inconveniente" da realidade... Não critico quem faz. Eu mesmo já fiz... Quem nunca fugiu de um problema? Ignorar as mazelas da sociedade. Nos sentimos impotentes ante tudo isso, acho eu.
Entrei em casa já comentando com a mãe o fato do rapaz que me pedira um calçado, uma roupa, ao que ela resmungou um "Ai meu Deus", típico de uma pessoa de 80 anos... E comentou algo sobre a infelicidade e a tristeza de tudo isso, que ela se entristece em ver na TV ou saber das dificuldades que as pessoas passam... A vida não é um mar de rosas, mãe...
Disse a ela que pensei que teria alguma coisa que pudesse dar pra ele. Eu realmente achava que tinha um sapato dos meus, que estava deixando de usar... Tanto que perguntei a ele, ainda no portão, que número ele calçava, se é que ele sabia, e ele disse que era 40 ou 41, mas que aceitava qualquer coisa... Claro, né? Pra quem não tem nada... Qualquer coisa é muito...!
Larguei as lâmpadas que carregava e fui ao meu quarto. Procurei os velhos
"buzigas" (que era como meu pai se referia aos sapatos...) mas não achei nada... Começei a imaginar se já os teria dado, quando renovei meu "estoque" de sapatos a meses atrás. Até porque eu uso um sapato até quase ele "se dissolver" - quando gosto... Outros, que não gosto, vão ficando armazenados, para eventuais usos... Geralmente eu tenho aquele sapato "pra bater", como se diz. Pra gastar mesmo, no dia a dia.
Mas não achei os sapatos velhos... E fiquei triste de ter prometido algo para os pés do guri, e que não conseguiria cumprir... Então passei do sapato para outras vestes. Abri o armário e selecionei umas camisetas que eu já não usava mais... E eu tenho camisetas boas ainda de quase ou mais e 10 anos atrás!! Camisetas que, hoje, não uso ou porque saíram de "moda" ou porque simplesmente não me servem mais... Encolheram (uma possibilidade)... Ou eu engordei (um fato...).
Selecionei uma camiseta pólo, cor de Fanta uva, que dificilmente me serviria ou eu usaria novamente, uma camiseta normal, de manga curta, e uma outra de manga comprida - afinal estava frio... Separei também uma cueca já mais velha, mas perfeitamente usável (será que esse pessoal de rua usa cuecas?!), e dois pares de meias... Se não consegui o calçado, ao menos as meias... Vai que ele consegue o sapato com outro alguém, aí já tem as meias! E por fim separei uma calça, jeans, que usei até a semana passada mas que resolveu, como muitas das minhas calças, a puir no mio das pernas, ficando com um rasgo que me impediria de usá-la, mas que certamente para quem estava de bermudas, naquele frio, seria uma mão na roda...
Buenas, munido de tudo isso, que nem é muito, ensacolei tudo e resolvi que ele ganharia mais uma jaqueta de jeans, que eu adorava mas que, infelizmente, não me fechava mais na barriga... Ah, essa minha maldita barriga...!! Peguei tudo e desci até o portão, ao invés de impessoalmente jogar tudo nas sacolas pelas sacada do meu apartamento...
Abri o portão e ele veio, ávido, até onde eu estava... Pedi para ele segurar uma das sacolas e tirei a jaqueta jeans de dentro... Mostrei a calça no fundo e ainda vesti a jaqueta em mim, pra ele ver que era boa, nova até (ou ao menos bem conservada) e que não me fechava na barriga... Ele ainda foi educado, sorrindo e dizendo
"Ah, o senhor tem o corpo grande", ao que eu respondi jocosamente
"Que nada, eu sou é gordo mesmo"...!
Mostrei a outra sacola com as peças e ele agradeceu. Falei que não conseguira o sapato que ele me pedira, mas que, ao invés, tinha conseguido outras coisas para ele. Ele sorriu timidamente e falou que tava bom assim... Eu disse que ele teria que cuidar agora, pra não roubarem as 'novas' coisas dele e perguntei onde ele morava - já pensando se não teria sido uma pergunta meio besta...
Ele disse que morava na rua, que estava morando a dois meses na rua, "por aí"... Eu me senti meio estranho, na porta do meu prédio, com todo o conforto, e conversando com alguém que sequer tem ONDE morar, dormir... Então disse a ele para procurar ajuda em albergues, em instituições que ajudam, coisa e tal, e ele disse que já teria ido nas instituições de ajuda, cidadania, etc, mas que muitas vezes nem eles têm o que fazer e que o haviam mandado embora...
Que situação... Eu só pude dizer que imaginava a situação dele... Não sei se imagino. Sequer sei se "entendo"... Nem sei, na verdade, se quero imaginar, entender ou compreender, porque deve ser doloroso demais - e eu sei que, a bem da verdade, ninguém está livre disso, de uma situação assim...
Enfim ele disse que não teria onde guardar as roupas mas que, se fosse o caso, vestiria todas, umas por cima das outras, para que ninguém as pegasse...
Do sapato, objeto motriz de todo esse encontro, lamentei e desejei que ele encontrasse alguém, outra "boa alma" que o ajudasse, pois ele tinha sido educado comigo, e não me pedido dinheiro... E que se ele agisse assim, outra pessoa iria lhe ajudar, com certeza. Disse para ele continuar assim, que ele conseguiria. E desejei-lhe sorte, que era o que, naquele momento, poderia fazer ainda. E ele se foi, agradecendo, de pés no chão, no frio da noite de Porto Alegre...
Apesar da tristeza desta imagem final, me senti bem, com a pouca ajuda que prestei, ao jovem que conseguiu ganhar minha atenção. Me senti feliz, esperando que ele fizesse bom uso das roupas que um dia foram minhas. Acho que ele levou um pouco de mim com ele. Da minha energia, talvez, se é que os objetos podem acumular a energia da gente... E se isso é bom um mal, já é outra história... Mas esperei que ele fizesse bom uso de tudo. Era só o que eu podia fazer...
COISA TRÊS:Recebi uma indicação e peguei um trabalho de tradução. Umas oito folhas de tradução de Inglês.
Dei meu preço. Foi aceito. Peguei...! Coisa boa. Trabalhinho honesto... din-din no bolso em breve. Pouco... mas já garante a "festa" do fim de semana...!
;o)Vai dar trabalho, é correria (para daqui a 3 ou 4 dias) mas o que, na vida, que não é correria...?!? Um material difícil, de biologia, psicologia, esquiziofrenia... Coisa "leve", hehehe...!
:oDO que importa é que fechou o dia com as outras coisas boas, me dando uma nova pilha, para me sentir bem...
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Coisas, coisas, coisas...A vida da gente é cheia de coisas diferentes, estranhas, enaltecedoras, impulsionantes...As vezes temos que dar margem a ver a beleza das pequenas coisas e até mesmo nos abrirmos para elas...B.
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