quinta-feira, 14 de novembro de 2019

A empática ascenção do mal...



Fui assistir ontem ao filme do "Coringa"... Bah, que filme...!! E neste "bah" e neste "que filme", dá pra se incluir "N" estados de espírito e de deslumbramento, introspecção, reflexão, pena, dor, caos, metáforas, empatia, simpatia, antipatia, enfim...

O Coringa em si, o personagem, neste filme, é o herói, ou anti-herói, de uma comédia trágica, lenta, densa, pesada, claustrofóbica e triste.

Do seu fragmento de momento de vida mostrado na tela - que representa a ascenção do personagem (do vilão) em detrimento do homem (a pessoa, triste, pobre e doente), em seu destino levado do ostracismo e praticamente abandono social, exclusão e estigmatização, até sua súbita e trágica ascenção ao caráter de mártir revolucionário, errôneo, errado, mas interpretado como uma espécie de "salvador da pátria" (daquela Gotham City doente, espelhada na realidade de hoje ou "de sempre", visto que o filme se passa em um passado "paralelo" ao da nossa realidade) - o que se vê e percebe é uma sucessão de caos e acasos - alguns até "bem intencionados" - mas que apenas resultam em mais e mais erros e confusão, levando ao climax da eclosão do "Coringa" em si, como a antítese do herói, o anti-herói, combatendo as "forças que são" (os "The Powers that be", os poderosos) através da única forma que finalmente consegue e conseguiu, ainda que até meio que quase sem querer: a força, a revolta, a explosão do "não aguento mais"...!

É um filme que não se sai do cinema "gostando", por mais que se possa sair maravilhado, com o trabalho fantástico da Direção (realmente!!!), da Direção de Arte (com uma Gotham quase real demais), da Composição Orquestral (que tem o peso de um Titanic afundando na sua cabeça!!), e acima de tudo (não tem como negar...) no magistral trabalho de interpretação de Joaquim Phoenix, que traz um Coringa (ou Arthur Fleck até quase o final...) triste, doloroso, magro, quase esquálido, pobre, doente, ainda que tentando ser gentil, simpático e empático até...! Se Phoenix não levar um Oscar pelo filme... é marmelada...!!

Arthur Fleck sofre tanto, de todos os lados, neste filme, que é simplesmente impossível não sofrer com ele, por ele e, com isso, torcer por ele, de alguma forma, MESMO SABENDO que ele é ou será ou se tornará um dos mais cruéis bandidos ou vilões de Gotham City e "futuro inimigo pessoal" do outro, este sim "herói" (ou vigilante, como queiram...), o Batman...!! Mas isso não fala, não se comenta, nem se cogita, no filme... Neste "Coringa", Batman sequer existe...!! Bruce Wayne é ainda uma criança vivendo com seus pais e até sua breve interação com o Fleck-quase-Coringa chega a ser surpreendente e, mais uma vez, triste e penosa... Nada dá certo para este Arthur, nem mesmo a quase talvez última esperança de quem sabe ter uma vida um pouco minimamente melhor... mas que no final só lhe rende mais dor e um nariz quase quebrado em uma sala de ópera...!!

Enfim, o ocaso. Enfim, a exaltação. Arthur se despede da vida em cadeia nacional para que seu alter-ego forçado à exaustão ecloda diante de uma platéia extasiada entre a comédia penosa e o horror deflagrado...! E como uma bala (não perdida) o Coringa surge, marginal e violento, casual e brincalhão, louco e nem tão errado assim, diante de tudo que vê pela frente...!

Nunca um vilão foi tão bom assim. Nunca um vilão talvez tenha sido o herói que não desejamos ver, mas vemos, e talvez até sem vergonha, gostemos de ver sua vitória... Vergonha? Não. Palmas! Palmas a todos!! Ao ator, ao diretor, a todos os envolvidos, e a nós mesmos, que percebemos que somos, no fundo "a piada mortal", esperando para sair no riso incontido da dor que sentimos todo dia... .

Buzz

(MSC)